sábado, 4 de julho de 2009

Lixo À Beira Da Estrada - Cap 6

A segunda-feira era o dia de descanso meu e da minha coroa. Ela não abria o trailer apesar da reclamação dos clientes habituais. Íamos à Praia da Urca com águas calmas e vista impressionante. Levávamos um farnel com sanduíches e alguns pastéis, coxinhas ou risoles que sobravam da véspera. A cerveja comprávamos de ambulantes e a CONTIGO, leitura de fé da minha coroa, era sempre comprada na banca da D. Célia ao lado do ponto em que saltávamos. A banca era quase em frente à casa do Rei, Roberto Carlos. Minha coroa sempre perguntava por ele à D. Célia. Vez por outra ganhava uma confidência do tipo: ”Ontem, o motorista dele comprou todas as revistas que traziam matérias sobre o show que fez no Copacabana Palace!”. Às vezes outras mais picantes como “Mandou comprar a Preibói nova. Ele ficou viúvo. É muito solitário, sabe como é...”.
Minha coroa dizia que era louca pelas músicas dele, mas homem para ela era o Valdick, o Tarcísio Meira e o mulatinho querido dela, eu, Wadsonzinho.
E tinha também o tal de Zé/Zeca/Zézinho mas esse e nunca soube quem era.

Eu já tinha ganhado corpo, eu nadava, aprendera a fazer exercício com peso com os coroas do Aterro e tinha virado um moreno bonito, sempre queimado de sol. Meu cabelo era bom, ondulado e meus olhos eram castanhos claros. Apesar da minha origem muito humilde, o mundo novo que se abria para mim sugeria que talvez eu conseguisse entrar.
O curso noturno na faculdade de direito no Centro reforçava esse pensamento.
Ainda assim, minha autoestima masculina estava muito longe de ser, o que hoje ela é.
Eu era o aluno mais novo do meu ano e me vestia com roupas muito simples. Nunca percebia olhares interessados das alunas mais velhas da faculdade. Estavam quase sempre exaustas. Pra quem não sabe, curso noturno no Centro é de gente batalhadora da periferia que trabalha o dia inteiro e deixa de fazer refeição pra pagar a faculdade. Gente que dorme no ônibus e que come a quentinha, escondida na cozinha do escritório.

Era o início dos anos 80, meu sonho de mulher era a India Potira, em preto-branco-e-cinza, no Programa do Chacrinha. O “Brasil do Milagre” era muito mais desigual. A TV colorida só pegava na casa dos ricos e na vitrine das lojas de eletrodomésticos.

Aquela segunda-feira porém era especial, pois na terça encontraria a cartomante em sua casa às 13:00.
Fiz questão de ficar deitadão na esteira para pegar um bronze.
Minha coroa, ao meu lado, besuntada de bronzeador barato, com água oxigenada para clarear os pelos das pernas e entretida com a CONTIGO, estava feliz.
A tornozeleira de ouro refletia o sol de meio dia e o esmalte mal pintado nas unhas do pé aparecia, mesmo entre os grãos de areia.

Um comentário:

Layla Tom disse...

Aureliano,
vc já está nos anos 80... Ufa!
Estou ansiosa para chegar ao segundo milênio, hahahahaha.
A história é ótima, mas seus leitores não gostam de homeopatia.
besos
Layla